Pedro Rodrigues

Por D O em

Pedro Rodrigues num programa da Televisão Pública de Angola (TPA)

Pedro Manuel Monteiro Cardoso Rodrigues

São Lourenço, Fogo, 1946

Compositor

A obra de Pedro Rodrigues é um nítido exemplo de como a ligação com o país natal e mesmo a prática da língua cabo-verdiana conseguem impor-se a determinados artistas ainda que desde a infância tenham estado fora de Cabo Verde. Nascido na ilha do Fogo, o neto de Pedro Cardoso pela via materna foi com os pais para Angola por volta dos 5 anos. Só por volta dos 20, a conviver com a comunidade cabo-verdiana em Lisboa, onde se encontrava a estudar, é que começou a impregnar-se da cultura e da língua maternas, como relata em entrevista ao Voz di Povo numa das suas visitas ao arquipélago. “A minha cabo-verdianidade surgiu nos períodos mais próximos da independência” (Voz di Povo, 31.05.1986).

A veia de compositor, por sua vez, foi despertada algum tempo depois, quando se encontrava em Bissau a cumprir o serviço militar. É aí que Rodrigues conhece aquele que será o seu parceiro musical por muitos anos: Maiúka Marta. Estava-se em plena luta de libertação. A primeira composição, criada no dia de Natal de 1969, foi “Batuque é feitiço”, “tema que reflete o despertar de uma nova realidade – a consciência do homem negro – após sofrerem um ataque ao quartel onde estavam”, segundo a revista Nos Genti, que reproduz as palavras de Rodrigues: “O impacto daquela noite marcou para sempre a minha vida. Então fui para o quarto, peguei numa viola, e ainda sob o efeito daquele ataque, recordei a coragem que os guerrilheiros tinham tido, o que me inspirou profundamente. Essa música viria a marcar aquela geração em Angola. As pessoas cantavam o ‘Batuque é feitiço’ mas sempre às escondidas. Apenas se gravou o tema depois do 25 de abril. A partir desta música é que eu comecei a compor” (Nos Genti, 01.01.2012). “Batuque é feitiço” será gravada em Angola por Maiúka Marta, em 1975, acompanhado pelo conjunto Merengues, e ainda pelo Agrupamento Grito di Povo, do qual Pedro Rodrigues faz parte, três anos depois. Frank Mimita também grava a composição, que é uma das raras do autor em língua portuguesa.

A partir daí vão surgindo várias outras, num período de grande atividade criativa, inicialmente músicas de temática política, como “Janeiro na Conacry” e “5 de julho”, gravadas por Nho Balta, entre outros. Mais tarde deixam de ser letras tão explícitas e datadas, mas mantêm o olhar sensível às questões sociais e políticas – mesmo quando apenas se trata de escolher, e não escrever, os textos que vai musicar. É em 1981 que sai o disco de Bana com a primeira gravação de “Canta co alma sem ser magoado”, tema em que Rodrigues cria música para um poema de Arménio Vieira. Irá musicar também os poemas “Caminho do mato” (de Agostinho Neto), “Golpe d’estode na paraise” (de Corsino Fortes), “Lua nobo” (de Pedro Cardoso) e “Te log te log” (de Luís Romano).

No seu disco de 1983, Tema para dois, Os Tubarões – que Pedro Rodrigues aponta como os grandes impulsionadores da sua carreira como compositor (Nos Genti, 01.01.2012) – gravam pela primeira vez temas seus: “Bardolega” e “Cansera sem midida”Uma experiência real está por trás desta música, conta o compositor, que em 1978, enquanto integrante do grupo Grito di Povo, encontrava-se São Tomé e Príncipe na altura das comemorações da independência de Cabo Verde. Tendo partido uma perna num jogo de futebol, foi internado. Ao conversar com uma enfermeira filha de cabo-verdianos, fala em crioulo. “Ao lado da cama onde estava, vejo um indivíduo muito atento, a olhar para mim, que a certa altura me pergunta, também em crioulo, se eu era cabo-verdiano. Respondi que sim, mas que vivia em Angola. Então ele fez-me um pedido dramático: que eu comunicasse às autoridades cabo-verdianas o seu único desejo – morrer em Cabo Verde. Ele já estava em São Tomé há mais de 40 anos, sem nunca ter ido à pátria. No dia seguinte, quando acordei e olhei para o lado, o homem estava morto”. A experiência marcou-o, levando-o a compor a música, interpretada também por Cesária Évora, além de Os Tubarões, que irão gravar no total oito temas seus – há quatro em Bote, broce e linha e duas em Os Tubarões ao vivo.

Em 5 de julho de 2000, A Presidência da República de Cabo Verde condecorou Pedro Rodrigues com a primeira classe da medalha do Vulcão.

Pedro Rodrigues. Fonte: https://nosgenti.com

À parte as composições, as suas atividades musicais estiveram ligadas também ao já referido grupo Grito di Povo, formado em Angola por cabo-verdianos e angolanos, em que Rodrigues era vocalista e guitarrista. Profissionalmente, tal como Maiúka, esteve sempre ligado ao setor bancário, ainda antes da independência, e mais tarde no Banco Nacional de Angola. Nessa qualidade, os dois tiveram um programa televisivo na TV estatal angolana, em finais dos anos 1980, em que atuavam e convidavam outros artistas (Voz di Povo, 16.08.1990). Na sua juventude, Pedro Rodrigues esteve também ligado ao futebol, chegando a ser atleta federado.

Composições

Badjo na Fazenda; Bardolega; Batuque É Feitiço; Bida di Gossi; Bintém Pegado; Bran Bran d´Imigraçon; Camin di Mar; Caminho do Mato (música sobre poema de Agostinho Neto); Canta Cu Alma Sem Ser Magoado (música sobre poema de Arménio Vieira); Carnaval de São Vicente; Cartinha d´Holanda; CCC; 5 de Julho; Coba craqui (parceria com Tonecas Marta); Coitado Quem Dixa se Terra; Coitadu na terra stranhu; Cumpadre; Fim de semana na São Vicente/Santiago é ca so Praia; Golpe d´Estode na Paraise (música sobre poema de Corsino Fortes); Janero na Conacry (parceria com Nho Balta); Li Que Nha Tchon; Lua Nobo (música sobre poema de Pedro Cardoso); Manuel Suave; Na Pidjiguiti; Na Tabanca; Nha Cansera Ka Tem Medida; Nha Lamento; Nos Cabo Verde; Nôs Paraíso; Poeta di Valor; Primeiro di Maio na Djar Fogo; Resposta de Marido Exemplar / Casa di Nha Tudinha; Rosa de Amor; Sibu Tem Tcheu; Tati (parceria com Tonecas Marta); Te Log Te Log (música sobre poema de Luís Romano); Telegrama; Tranço mudjer bedja; Tudu Kusa Ê Badiu.

Para saber mais

Revista Nos Genti

Ouvir

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