50 anos a cantar Cabral

Por GN em

Cabo Verde & a Música – Museu Virtual associa-se às comemorações do Centenário de Amílcar Cabral divulgando composições que falam do líder político e pensador que faz parte não só da história de Cabo Verde mas também da música cabo-verdiana, seja pelos versos de “Regresso”, seja pelas letras de músicas que lamentam a sua morte, que exaltam o seu papel na trajetória do povo cabo-verdiano, que mantêm viva a sua memória. Em forma de canção, morna, koladera, samba, funaná, reggae… Diferentes géneros musicais têm servido, ao longo dos últimos 50 anos, para cantar Cabral.

Em Cabo Verde e na Guiné-Bissau, são muitas as composições que referem Amílcar Cabral. Começamos a nossa lista com o lamento que Tony Lima, na época a estudar em Paris e a liderar o grupo Kaoguiamo, compôs quando soube do assassinato do líder da luta pela independência. A composição consta do LP  Korda Skrabu! (1974), do Kaoguiamo: “Amílcar Cabral” (Tony Lima).*

Pela mesma época aproximadamente, Jotamonte compôs a sua homenagem póstuma. A composição não foi gravada, mas a sua letra e partitura encontram-se publicadas na obra Música Caboverdeana – Mornas para Piano, caixa com 29 mornas de Jorge Monteiro, partitura e letra, edição do Instituto Camões, 1995.

Numa sequência cronológica das gravações mencionando Amílcar Cabral, segue-se o grupo Voz de Cabo Verde, na sua versão lisboeta dos anos 1970, que no LP Independência (1975) gravou “Es Mata Cabral” (José Carlos Schwarz)*, composição que fala do momento em que os portugueses se deram conta de que tinham perdido a guerra.  

Em Angola, ainda em 1975, Maiuka e o Conjunto Merengue gravam “Viva Cabral”, no single Batuque é feitiço/Viva Cabral (1975). A letra, saúda a conquista da liberdade pelos povos da Guiné e de Cabo Verde é o refrão é “Viva Cabral!”.

No ano seguinte, Os Tubarões aparecem com o seu primeiro álbum, Pepe Lopi, com três temas que referem Cabral, todos em sintonia com o momento político que se vivia em Cabo Verde. “Labanta Braço” exalta a independência recém-conquistada; “Cabral Ca Mori”, morna que se tornou um verdadeiro hino à memória de Cabral, afirma a perenidade da sua figura. “Strela Negra” homenageia o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), que lutou pela liberdade nestes dois territórios e alerta para o facto de que os tempos mudaram e no novo contexto o inimigo já não tem uma face evidente.   

  • “Labanta Braço” (Alcides Spencer Brito), LP Pepe Lopi (1976)*  
  • “Cabral Ca Mori” (Daniel Rendall), LP Pepe Lopi  (1976)* 
  • “Strela Negra” (Ildo Lobo), LP Pepe Lopi (1976)* 

No disco seguinte, o LP Tchon di Morgado (1978), aparece “Patrice Lumumba”, poema de Ovídio Martins musicado por Humberto Évora em ritmo de samba. Os versos mencionam dois líderes políticos africanos já falecidos na altura da morte de Cabral, o ganês Kwame Nkruma e o congolês Patrice Lumumba, e também Che Guevara, assassinado em 1967.

Antes desta gravação pel’Os Tubarões, este tema aparecera em discos de Nho Balta (ver abaixo) e do grupo África Star. Anos mais tarde, será gravado pelo Grupo Rabasa.

A composição “Cabral gritá” (autoria: ?),* aparece no LP Câ Nhôs Dam Gravata (1976), do África Star, enquanto “Patrice Lumumba” faz parte do alinhamento do LP Os Reis do Baile (1978), do mesmo grupo.

Nho Balta, por sua vez, em vários dos seus álbuns gravou composições que têm Amílcar Cabral como tema.

  • “Midjor Fidjo” (Nho Balta),* do LP Nho Balta Ma Voz de Pove (Terra Livre), de 1977 (Mel d’Abelha, na edição em Portugal).
  • “Amílcar” (trata-se de “Patrice Lumumba”, Ovídio Martins/Humberto Évora),* do LP Nho Balta (1978). Nho Balta irá inserir esta composição também no seu LP Havemos de Voltar (1985).
  • “Janero Na Conakry” (Pedro Rodrigues),* no LP Terra Longe (1983). 

Em 1977, foi a vez do grupo Black Power e de Marino Silva cantarem Amílcar.

“És Matal” (Manuel Faustino),* aparece no LP Nos Cabo Verde Di Sperança (1977), do Black Power. A letra exorta o povo e os trabalhadores a gritarem a pensarem e prosseguirem a luta porque, enquanto não tomarem o poder, não terão sossego nem segurança, lembrando que a cor vermelha é da revolução e de um lado da bandeira (do PAIGC). “África, Guiné, Cabo Verde / Mundo intero tá revoltode”, diz a composição.

Marino Silva, cuja carreira até então fora marcada por mornas românticas e koladeras bem humoradas, entra também na onda revolucionária, gravando “Sacrifício de Cabral* (LP Karaté, 1977, com acompanhamento do Voz de Cabo Verde). “Nos lider Amilcar Cabral / trabadia tanto tempo / Pa libertá se povo / Até que enfim nô tem liberdade”, diz a letra composta por Armindo Pires.

“Cabral 1924-1973” (Abel Lima)* é o título da composição que Abel Lima grava no seu LP Goenta Canela (1979). É uma verdadeira biografia de Cabral, mencionando a data de nascimento, seu percurso de liderança e o assassinato, a 20.03.1973, quando “África e mundo inteiro tchora morte di Cabral”. Cabral dominou o conquistador mais com a cabeça do que com armas, afirma a letra. A inveja da sua sabedoria é que desorientou os “tugas”, canta Abel Lima, referindo que mesmo com a traição que levou ao seu assassínio, as independências foram conquistadas.

Djô, no álbum Formidável, de 1979, interpreta “Verdade de Cabral” (Armindo Pires/Manuel Sequeira Monteiro)*. Seguem-se Pedrinho, com “Es matabo só por inveja” (Pedrinho), no LP Nhós Déxa de Conta Mintira (1981), e Nanhe d´Guida, com “Amílcar Cabral” (Nanhe d’ Guida), no LP Telegrama (1982). Trata-se da melodia de “Djonsinho Cabral” com outra letra, mais explícita falando da morte de Cabral.

José Augusto, com “Mata Cabral”,* em álbum que não se conseguiu identificar, mas que aparece na compilação Evocação de Amílcar Cabral no Folclore Cabo-Verdiano, é outra composição dessa época, exaltando o PAIGC e condenando o assassínio de Cabral pelos portugueses.

Avançando para finais da década de 1990, temos o Cabo Verde Show com a salsa “Amilcar Cabral”,* cuja letra dialoga com Cabral, mostrando-lhe como Cabo Verde está a progredir. O tema encontra-se no LP La Coladeira (1999, reedição em CD em 2006).

Em 2007, Mario Lúcio, no álbum Badyo, grava a composição, da sua autoria, “Diogo e Cabral”, na qual comenta que Diogo Gomes tem a sua estátua no alto do Plateau, ao lado da Presidência da República e com os olhos voltados para o parlamento, enquanto na sua representação no bairro da Várzea, Amílcar Cabral está virado para o cemitério.

O grupo Rabasa, por sua vez, que gravou em 2008 no CD Portucabo o poema de Ovídio Martins musicado por Humberto Évora, lançou em 2024 o single digital “Homi di povu” (João Ortet), associando-se assim às comemorações do centenário de Cabral.  

Camilo Montrond, no seu CD Saluss (2013), interpreta “Nos Cabral”. E canta, acompanhando-se ao violão, em formato acústico, gravado em Chã das Caldeiras: “Kenha ki mori ki sol nega limia? / kenha ki mori ki lua tchora?” / Era nosso midjor amigo / Era nosso midjor heroi.”

Jovino dos Santos, por seu lado, lança em single digital “Ode a Amilcar Cabral”, neste ano em que se comemora o centenário. “Pa combate es kolonialismo bo nascê na terra longe / Bo cria na Cabo Verde / Oji bo nome ta escrito na história de África…”, escreveu Jovino.

Maribel Veiga apresenta neste vídeo a sua versão da canção de Tony Lima:

Entre os representanes do rap, são várias as criações mencionando Cabral e o seu exemplo e até há uma página só para eles. Confira:

Terreru, grupo formado por Calu di Guida, Maruka Tavares, Jacinto Fernandes, Djinho Barbosa e Djoy Amado, prepara a sua própria homenagem a Amílcar Cabral – a divulgar em breve aqui.

* Gravação inserida na compilação Evocação de Amílcar Cabral no Folclore Cabo-Verdiano (vol. 4 da série “Música Cabo-Verdiana por Temas”), produzida e editada por Alberto Rui Machado em 2003.

Agradecimentos pelo apoio à construção desta página: Francisco Sequeira, Heloisa Monteiro.

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