Gida Mendi, Nha
Margarida Mendes Varela
Santa Cruz, Santiago, [1897] – Praia, Santiago 1991
Batukadera, compositora de finason
Tudo o que se sabe sobre esta cantadeira de finason é o que ela própria revelou ao investigador Tomé Varela da Silva, que, alguns meses antes da sua morte, publicou o livro Ña Gida Mendi – Simenti di onti na tchon di mañan (1990), com seus finasons, finasons-sambunas e sambunas, para além de dados biográficos.
Numa das fases de fome do início do século XX, uma família do Fogo levou a menina – já iniciada nos terreiros de batuku nos Órgãos, seguindo o exemplo dos próprios pais – como criada para aquela ilha, iniciando o longo período em que ela ficará afastada destas rodas de batuku. No Fogo, ela passará algum tempo depois para a casa da mãe do poeta Pedro Cardoso e depois será ama de todos os filhos deste, acompanhando a família nas mudanças que o seu cargo de funcionário público determinava. Por essa razão, ainda bem jovem, Nha Gida viveu na Brava, em São Nicolau e na Boa Vista, mas a certa altura o pai decidiu que ela voltasse a viver em Santiago. Mais tarde, como ama de um dos filhos do comerciante Salomão Benoliel, acompanhou a família a Portugal, deixando para trás o seu próprio filho, que morreu pouco tempo depois. Quando regressou para Cabo Verde, irá trabalhar outra vez na casa de Pedro Cardoso.
Depois disso, Nha Gida Mendi adquiriu um barco e passou a comercializar peixe. Mas a sua boa fama nos trabalhos domésticos fazia com que fosse sempre solicitada para cuidar de roupas finas das famílias abastadas. Construiu a sua casa na Achada Grande, onde viveu com Bia, a única que lhe ficou dos três filhos que teve. O companheiro, emigrado nos EUA, morreu por lá.
Então, Nha Gida Mendi retomou o batuku, e durante anos e anos era constantemente convidada para animar festas. Quando, em 1955, o presidente Craveiro Lopes visita a colónia de Cabo Verde, ela é chamada para cantar nos estúdios da Rádio Clube de Cabo Verde (RCCV). Em 1963, partiu para a Guiné, onde viveu com a filha até 1978, quando ambas regressam a Cabo Verde.
Com pouco mais de 80 anos, chegou à Praia, nesta altura uma cidade já bem diferente daquela dos seus tempos de cantadeira famosa e onde já ninguém a conhecia. Em 1984, a pesquisar as tradições orais de Santiago, Tomé Varela da Silva, em busca de uma outra cantadeira, encontrou-a a viver numa casa alugada (perdeu a sua para alguém que ficou a tomar conta), cega e esquecida, mas ainda bastante lúcida para contar a sua história e cantar as suas cantigas. E orgulhosa de ter passado por três bandeiras: a da monarquia, a da república e a de Cabo Verde independente. Morreu três dias antes das primeiras eleições multipartidárias de 1991.
Para saber mais
Ña Gida Mendi – Simenti di onti na tchon di mañan, Tomé Varela da Silva, Instituto Caboverdiano do Livro, Praia, 1990. Aspetos biográficos, reprodução das cantigas e análise. Em cabo-verdiano.
Batuku de Cabo Verde – Percurso histórico-musical, Gláucia Nogueira, Pedro Cardoso Livraria, Praia, 2015.